Confira a técnica que vai agarrar o público até o final da sua história
Gancho narrativo é tudo que você insere na sua história que deixa uma pergunta dramática na cabeça do seu público. A famosa pulga atrás da orelha. É uma técnica muito poderosa que, se usada com perfeição, vai fazer sua história ser entendida e consumida de maneira mais eficiente. Se você começar sua história com um gancho narrativo bacana, ela vai se destacar. E vai fazer a diferença quando você for mandar seu roteiro para um produtor, por exemplo, que recebe dez, quinze, trinta textos por dia. Por que ele vai continuar lendo o seu? Porque o seu vai ter um gancho narrativo e ele vai querer saber mais. Isso vale para concursos e editais também. Sua história não vai ser mais uma entre tantas outras.
Como falamos anteriormente, o gancho narrativo coloca uma pergunta em cima do público. Transforma a audiência naquele seu tio fofoqueiro, que fica querendo saber de tudo, te fazendo várias perguntas. Se você conseguir deixar seu público curioso, querendo saber o que vai acontecer depois, pronto: você fez um bom gancho narrativo. E nós vamos te ajudar, apresentando algumas boas maneiras de se fazer isso.
ABERTURA FRIA
“Abertura Fria” é quando o filme começa sem aviso, sem créditos, quando ele já chega chegando. Não tem abertura, não tem apresentação, não tem nada. Simplesmente a história começa do nada. Só depois é que os créditos aparecem. É quando você está no cinema e aquele cara da pipoca chega meio atrasado e passa na sua frente. E então, quando você vai ver, o filme já começou.
Uma franquia que usa muito essa técnica é a série do James Bond, “007”. Quem se lembra do Cassino Royale, que já começa com o agente em uma super perseguição, com direito a parkour e subida em cima de guindaste? Só depois de tudo isso é que vem a abertura clássica do filme, com aquela música tema muito bacana e dramática. Mas antes eles já te colocam dentro do filme. Quem usa muito “abertura fria” também são as séries de comédia. Pode reparar: “The Big Bang Theory”, “Two and a Half Men”, “Friends” e por aí vai. Começam com uma esquetezinha cômica e só depois vem a abertura. Uma série espetacuçar que também uttiliza essa técnica é a “The Good Fight”. Às vezes os créditos só vão aparecer lá na metade do episódio.
IN MEDIA RES
A segunda técnica que vamos apresentar tem esse nome diferente, que significa “no meio da coisa”. O vulgo “ih, já tá rolando”. É quando você pega uma cena muito bacana da sua história, normalmente do clímax dela, e traz para o começo. Ou seja, o filme começa com uma cena do meio da história e só depois é que vamos para o momento zero da linha do tempo.
Muitos filmes usam essa técnica. “Se Beber Não Case” já começa mostrando aqueles caras largados no meio do deserto. Um deles, com um machucado na boca, liga para uma mulher e diz: “Nós perdemos o Doug. Não vai ter casamento.”. A gente não sabe nada dos personagens e vai descobrindo aos poucos por que eles se meteram naquela enrascada. Ligamos até o que chamamos de bomba-relógio, que é quando a audiência fica ansiosa para chegar à cena da abertura. Só depois dessa abertura, dessa cena que foi tirada do meio do filme, é que o filme de fato começa no tempo zero.
OMISSÃO DRAMÁTICA
Essa terceira técnica é muito utilizada, principalmente em filmes de terror. A “omissão dramática” é quando você, escritor, deliberadamente escolhe algumas coisas para não mostrar naquele momento. Isso cria uma curiosidade, pois a audiência está vendo sim, mas não a situação completa. Às vezes nem o personagem completo.
O filme “Tubarão” começa pelo ponto de vista do tubarão, mas sem mostrar sua figura. Só vemos através de um monstro que está atacando a praia. Isso gera ansiedade. E quando, na metade do filme, um tubarão pula do mar, a reação do público é gritar. Afinal, estava envolto no clima que a “omissão dramática” criou. “Alien”, “Predador” e outros tantos filmes de terror, principalmente esses de monstro, usam essa técnica. Não mostram o monstro logo de uma vez. Vão mostrando os efeitos, pedaços deles, para quando ele aparecer por completo, a audiência já estar tão curiosa e ansiosa, que o efeito é muito bacana. E não é só em filme de terror que a “omissão dramática” é utilizada. Spielberg também fez isso em “ET: O Extraterrestre”, lembra?
ESTRANHEZA
Essa técnica é quando você se pergunta “bicho, que que é isso?” ou “que raio é esse que tá acontecendo nessa história?”. Se você tem uma coisa muito peculiar, muito curiosa, uma coisa única, que só acontece na sua história, para que ficar guardando isso para o meio ou para o final? De repente seu público nem vai chegar lá. Se você coloca isso logo no começo, já atiça a curiosidade da sua audiência. O ser humano é um bicho curioso.
“1984”, um clássico da literatura, começa exatamente com uma questão estranha. Era “um dia frio e luminoso de abril e os relógios marcavam treze horas”. Só que o treze horas deles não são o nosso uma hora da tarde. O relógio deles não vai até o doze, mas até o treze. E quando você lê essa sentença logo no começo do livro, pensa que aquele lugar é muito esquisito, no mínimo diferente. Você fica curioso para entender melhor. É como se “Star Wars” começasse com algo do tipo: “Amanheceu em Tatooine com seus dois sóis ardentes”. Que raio de lugar é esse?
MOMENTO CRUCIAL
Comece sua história no momento crucial. No momento “aí ferrou”. Em vez de começar escrevendo amenidades ou o dia a dia do seu personagem, comece com uma coisa crucial, um momento-chave da vida dele. Isso tem um efeito muito legal. Um exemplo de filme que utilizou essa técnica, e diga-se de passagem ganhou cinco Oscars, é o “Beleza Americana”. Temos a apresentação do personagem principal, Lester, mostrando um subúrbio americano comum, e ele próprio narrando: “Meu nome é Lester, esse aqui é o meu bairro, essa aqui é a minha rua, essa aqui é a minha vida. Eu tenho 42 anos de idade e em menos de um ano vou estar morto”. Como assim? Quem é esse personagem? Ele parece ter uma vida como qualquer cidadão comum e vai morrer por quê? Note a diferença entre a surpresa do filme estar em ele morrer no final e já abrirmos a história falando que o personagem vai morrer. Mais importante do que saber o que vai acontecer é como isso vai acontecer.?
TUDO JUNTO E MISTURADO
Você deve estar se perguntando: “Tá bom, entendi cada uma das formas de se fazer um gancho narrativo, mas, afinal, qual é a melhor delas?”. A verdade é que uma técnica não exclui a outra. Por que não fazer tudo junto? Isso mesmo, tudo junto. Uma série que utilizou todas essas cinco técnicas com perfeição, e não é à toa que é uma das melhores séries já feitas na televisão, foi a “Breaking Bad”. A sequência de cenas iniciais do piloto desse série não tem créditos, uma abertura fria. Uma calça voando no meio do deserto, um motorhome desgovernado e, dentro dele, um homem de cueca e com máscara de gás. Haja estranheza. A cena corta e ainda mostra dois corpos no fundo do motorhome. Não sabemos de nada da série e já nos deparamos com tudo isso. Essa cena, na verdade, foi extraída lá do final do episódio, ou seja, começou in media res. O homem sai desesperado, tossindo, cuspindo, bota uma camisa para se proteger e, de repente, saca uma arma e tenta se matar. Se tem momento mais crucial, desconhecemos. De repente, ele pega uma filmadora e começa a filmar, pedindo para família o desculpar, falando tudo que ele fez foi por amor. Então desiste de se matar, e aponta a arma em direção ao barulho das sirenes que estão cada vez mais próximas, mostrando que a polícia logo chegará. Por fim, ainda temos uma omissão dramática, pois só depois vamos descobrir que as sirenes não eram da polícia. Cinco ganchos narrativos utilizados na abertura de um dos melhores pilotos de uma das melhores séries já escritas para a televisão. Então, não alivie a mão. Se a sua história tem tudo isso, use tudo isso. Sem moderação.